Gedeone, o cara que deu início a tudo (pra mim, também)
Nem sei como lamentar a morte de um ídolo. Sim, Gedeone Malagola era mesmo um cara que eu admirava. Afinal, quantas pessoas você pode dizer que viveram de quadrinhos no Brasil – e sem depender de nenhuma major, nacional ou internacional? Era o caso do mestre, que conheci num longínquo 1991 na Casa de Cultura de Jundiaí.
Gedeone tinha influenciado diretamente, à época, pelo menos três das cinco pessoas presentes àquela mesa de debates de grandes projetos: eu mesmo, Emerson Eduardo Luiz (o Miranda, falecido há alguns anos) e o Ricardo Giassetti. Também estavam por lá o Jean Okada e o Dennis Anderson, único que não seguiu carreira em quadrinhos.
Gedeone dava cursos de HQ na Casa de Cultura, sendo que Miranda e Ricardo eram meio que seus pupilos mais adorados. Lembro que ele era um pouco taciturno, mas quis saber no que estávamos trabalhando (era nas primeiras histórias de Pet Nash, personagem que estrearia só oito anos depois, na revista Metal Pesado). Deu alguns conselhos, gostou do visual do personagem, apesar de criticar o armamento que ele usava.
Eram os anos 90 e era bacana brincar com esses clichês, mas isso talvez fosse demais para o mestre, que saiu de lá minutos depois. De lá pra cá, falei algumas vezes com ele, a maioria por telefone. A última foi recentemente, para conversar sobre o Spirit de Will Eisner, há exatos seis meses.
Gedeone nunca soube, mas, quando comecei a escrever para a ICEA – que, em 1991, publicava Mephisto e Os Guerreiros de Jobah, e que seria, logo após, uma das publicadoras recentes de histórias inéditas do Raio Negro –, a Neuza Luz (secretária de redação da editora agrícola campineira e verdadeira pau-pra-toda-obra) me disse que o Gedeone era um dos motivos inspiradores deles tentarem publicar quadrinhos por lá.
Foi quando conheci o trabalho do mestre e me empolguei. A ICEA era uma boa editora, na verdade – apenas equivocada. E eu era só um cara de 19 anos a quem eles resolveram dar ouvidos. Sorte minha. Era uma carreira que começava, que me levou de vez ao jornalismo e a batalhar para ser, mesmo, escritor/roteirista.
Daí, ontem, chegou o e-mail do Manoel de Souza, da revista Mundo dos Super-Heróis, e fiquei baqueado na hora. Muita gente boa foi embora na última semana, não só nos quadrinhos: Fernando Torres, Waldick Soriano, Richard Wright (tecladista do Pink Floyd), David Foster Wallace (escritor que era uma inspiração pra minha geração) e, agora, o Gedeone. Isso pra não falar do Colonnese, mês passado. Dá um nó na garganta.
Mas o Gedeone, ao contrário de muita gente que passa, deixa um dos maiores legados dos quadrinhos nacionais, cujo maior reflexo se vê justamente agora, nessa novíssima geração de produtores de HQs nacionais, com enfoque especial pro pessoal do Quarto Mundo.
Ele inspirou muita gente, liberava o uso de seus personagens para participações em histórias de outros heróis, adorava conversar sobre quadrinhos e, claro, era uma verdadeira enciclopédia sobre o assunto. Ao contrário de muitos picaretas por aí que ficam falando que fizeram e aconteceram, Gedeone realmente fez e aconteceu. No Brasil. Com heróis. E não só: terror, suspense, ficção científica e romance foram gêneros também explorados com sucesso pelo escritor e desenhista.
Se ele copiou o Lanterna Verde? Até aí, quando perguntaram ao Steve Ditko de onde ele tirou a idéia para o Blue Beetle (Besouro Azul), à época da Charlton, ele decepcionou milhares de fãs ao responder, sinceramente: "Green Hornet" – sim, o Besouro Verde da TV e das HQs.
Inspirações existem desde a época do Super-Homem. Mas o Raio Negro era um militar todo certo, bem diferente do civil rebelde Hal Jordan. O Homem-Lua também tinha outras nuances que o diferiram de sua inspiração principal assumida, o Fantasma, de Falk e Moore. E o trabalho de um criador também é agregar valores a mitos. Gedeone fez a sua parte. E, agora, continuam fazendo por ele.
Queria tê-lo conhecido mais. O Giassetti sabe que tem pelo menos um personagem dele, que não é o Raio Negro, que me é muito caro, e algum dia quero escrevê-lo. Gedeone não poderá vê-lo, mas sei que ele gostaria muito de saber que sua obra, em absoluto, não morreu com ele.
Daqui, a gente segura os seus sonhos por você.
6 comentários:
Se não deixarmos, a obra não morre jamais.
Bom descanso ao Gedeone.
O Raio Negro foi o primeiro super-herói brasileiro que conheci. Nem sabia que existiam quadrinhos feitos no Brasil. Isto foi uma semente pra que eu me tornasse desenhista e ilustrador.
Gedeone deixou marcas na vida de todos que o conheceram, troquei cartas com ele quando ele me permitiu usar o Raio Negro num crossover a Mulher-Estupenda. Me deixou muito feliz o fato de saber que ele gostou e aprovou o resultado:)
A matéria prestou uma bela e merecida homenagem a este astro do quadrinho brazuca, pena que a Wizard Brasileira não tenha liberdade editorial para dedicar-lhe uma matéria com pelo menos 4 páginas, como fazem para qualquer babaca da gringolandia que morre. É uma pena!
Mas é essa diferença que está fazendo a Mundo dos Super-Heróis a revista mais respeitada pelos fãs de quadrinhos.
desculpa mudar de assunto,
não vai ter resenha essa semana ?
Uma grande perda!
É ótimo queimar a língua de vez em quando :) Finalmente a Wizmania fez uma matéria decente sobre um artista brasileiro! Na Edição#05 - setembro-2008 a revista trouxe uma matéria em homenagem ao mestre GEugênio Colonnese. Agora, será que vão ter a sensibilidade de fazer o mesmo pelo Gedeone? Vamos pagar pra ver! Outro ponto positivo da edição é a matéria/entrevista com o batalhador Lorde Lobo sobre seu excelente Penitente. Iniciativas assim tenho certeza que alegrariam caras que tanto lutaram pelo quadrinho brasileiro como Gedeone e Colonnese! Tomara que a Wizmania fique cada vez mais brasileira porque a concorencia pega pesado neste quesito:)
O "legado" do Malagola é baseado em oportunismo, enganação, descuido (pois nunca registrou nada) e plágio.
Plágio.
Você se ilude e idolatra um ladrão.
Que vergonha prá você.
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